O novo Porto (Relíquias III)

Ja nom é Porto aquela cidade em ruínas que descobri há vinte anos, o templo da saudade que me turrava da alma com o peso brutal do passado em cada recanto.

Poida que seja o mínimo consolo, a esperança de recuperaçom que supom ver todas essas fachadas renovadas, mesmo com tudo o que tenhem e falso e de oco. Segue linda, mas perdeu a sua estranheza, o mistério de como acabara tam abandonada, de onde lhe vinham as cicatrizes tam enormes.

Ou será acaso a minha própria mudança. Na última visita atopo umha cidade composta polas minhas próprias lembranças. Visitas quase anuais, as amizades lá, pesam bem mais do que a própria urbe e a sua ferida. A compreensom adquirida sobre as suas dinámicas. O familiar que tenhem já tantos recunchos, vencelhados à minha vida. A descoberta ao acaso de Lello e Irmão há 20 anos. As Taipas. Os cafés com a Margarida. A visita ao espigom com Heidi e Kim. A rápida paragem num 25 de abril a oubir o “FMI” de José Mário Branco nos Aliados. Os concertos de Caetano, Marisa Monte, Deolinda com tanta gente. As noites nas liteiras do “Duas nações”. Os percursos com a Belém e o Worst Tour que tanto ajudou a dar-lhe sentido à problemática magia do lugar e das suas metamorfoses.

A transformaçom dá-me para senti-la um bocado como própria, já nom com aquela estranheça de monumento a tempos idos.

Era no começo Porto também um paraíso da nossa língua, umha terra libertada, um universo de livros novos, os lugares da mística do 25 de abril, a conexão com a antiga estranheza da minha mãe nos seus contatos clandestinos com o país, a semelhança tingida de contínua surpresa.

Por trás das fachadas desta cidade tam diferente adivinham-se vidas anódinas de turismo, teletrabalho, computadoras e Netflix. Já nom a evocaçom lendária as ruíndas, das casas de negócios ultramarinos, das pousadas de viajantes e as vidas entre negócios pioneiros baixo regimes que punham tudo em gris. Nom há louças antigas e lojas de eletrodomésticos velhos, todas elas até certo ponto familiares, que nos situam em contextos de modas misteriosas, de códigos alternos. A cidade de agora já nom me fai trabalhar constantemente o magim. Velaí o poder que perdeu, essa capa de imaginaçom que exige cada ruína.

.

Esta entrada foi publicada em Na ilha, Relíquias. ligação permanente.

Deixe um comentário