Celulosas

Ao abeiro da sentença que condena a Ria de Pontevedra a ficar com ENCE instalada sesenta anos mais, decato-me de como percebia a geografia da opressom que configuraba a cidade da minha infáncia e adolescência. Era aquele um mapa de fechamentos do que a daquela Celulosas era o fito mais destacado.

As cheminés e o fume marcavam o horizonte cara à ria, a fechar um espaço que tinha o potencial de se olhar como umha via de escape. Umha fortaleza que reforçava Tambo, a ilha proibida pola ocupaçom militar e que nos roubava o solpor. O fume e o cheiro a remarcar essa presença permanente que se vivia como um abuso, como mais um símbolo de injustiça.

Parte do abafamento que provocava a cidade vinha de aquele estar rodeada por fábricas. O rio túrbio até o impossível era mais umha barreira de proibiçom. Cara ao norte, o vertedoiro, a fatoria de cemento, as marinhas desertas e cheias de lixo, a Cross misteriosa. Ainda o Vao como mais um espaço vedado que completou a invasom da autoestrada, a fechar ainda mais a contorna com um novo muro. Da outra banda Tafisa, Monteporreiro e A Seca, lugares de novo perigosos, territórios alheios. Até a zona nova aparecia como um lugar do que desconfiar, alheio ao nosso jeito de vida de pobres.

Filtravam esses lugares, coma exércitos ao assédio dumha grande lixeira, a sensaçom clara de que nom tinhamos poder e que deviamos conviver com aquela merda. Contribuiria também o morar num casco histórico onde se infiltrava a desesperança, onde nom nascia nada novo e onde os mapamundis que armava a humidade nas paredes, o frio que se filtrava por baixo das janelas, a falta de luz, a invasom da contorna polos junkies, situava-nos num universo de decadência permanente, de impotência, no que a fugida aparecia como a opçom mais necessária. Umha fugida que no meu caso foi para o passado, o fantástico, os afetos, outros lugares, e que me trouxo, nom sem danos, até cá.

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